A Corregedoria do Detran investiga uma denúncia de fraude na expedição de Carteiras Nacionais de Habilitação (CNH) de motoristas de Olímpia, que teriam sido emitidas irregularmente na cidade de Icém. O esquema ilícito funcionaria há pelo menos cinco anos, período em que foram emitidos cerca de 6.000 documentos na cidade, número equivalente à população do município.

De acordo com a informação divulgada na terça-feira, 11 de setembro, por um um jornal de São José do Rio Preto, supostamente aliciados por representantes de duas auto-escolas: Fênix e São Paulo e o Despachante Icém, motoristas são suspeitos de forjar comprovantes de residência para retirar o documento na cidade, onde o preço cobrado pelas auto-escolas é considerado baixo.

Nesses casos, funcionários da Ciretran facilitariam os exames de habilitação e renovação. O delegado da Ciretran de Icem, Pedro Curti, nega o envolvimento de seus funcionários.

No entanto, de acordo com o delegado de Guaraci, Mário Renato Depieri Michelli, que denunciou o caso ao Detran, dentro do esquema, os aliciadores recrutavam moradores de toda a região e de cidades de Minas Gerais para retirar ou renovar a CNH em Icém.

Mário Michelli teria constatado que pelo menos 37 motoristas de Guaraci foram aliciados pelos agentes de Icém. Os candidatos, segundo denunciou, iam de ônibus fretados até a cidade. Todos foram indiciados por falsidade ideológica.

Consta que somente nos últimos dois anos, 150 moradores de Guaraci teriam utilizado o esquema, que também teve o envolvimento de moradores de Olímpia, São José do Rio Preto, Severínia, Altair, Cajobi e Embaúba, no Noroeste paulista, e Frutal, Fronteira e Uberaba, no Triângulo Mineiro.

O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) determina que o candidato a motorista retire a CNH na cidade onde tem domicílio. Assim, os envolvidos forneciam endereços falsos de Icém, por meio de declarações assinadas em cartório.

Na semana passada, nove policiais da Corregedoria do Detran de São Paulo fizeram uma blitz na Ciretran de Icém. Eles teriam ficado cerca de 12 horas no local, vasculhando computadores e documentos e levaram duas caixas cheias de papéis. Não há prazo para o fim da apuração, de acordo com a assessoria do Detran.

Na denúncia ao Detran, Depieri aponta a possível participação de funcionários da Circunscrição Regional de Trânsito de Icém no esquema. “A cidade é pequena, o funcionário estranharia de repente receber um monte de gente de outras cidades interessadas na carteira de habilitação”, disse o delegado.

Consta que um morador de Icem, que não quis ser identificado, disse ter recebido o gabarito completo da prova de renovação da CNH no ano passado. “A moça ia me falando todas as respostas”, afirmou.

A Delegacia Seccional de Rio Preto abriu inquérito na semana passada para apurar suposto crime de falsidade ideológica contra os motoristas, os aliciadores e as auto-escolas do município. O delegado seccional, Joseli Curti, disse que, até agora, não tem indícios da participação de funcionários da Ciretran no esquema.

A Polícia Civil de Fronteira, onde haveria 20 casos confirmados, também abriu inquérito contra três aliciadores na cidade por falsidade ideológica e estelionato. O trio alugava ônibus para levar candidatos a motorista até o município vizinho.

Consta que, se em Icém o candidato tira a carteira em 15 dias, em Minas demora de um a dois meses, porque, diferente das Ciretrans paulistas, no Estado vizinho há equipes volantes do Detran que só passam pelos municípios de tempos em tempos.

O delegado Pedro Curti, que há 15 dias responde pela Circunscrição de Trânsito de Icém, atribui a migração de motoristas de Guaraci para Icém à ausência de posto da Ciretran naquela cidade. O Detran tem intensificado a fiscalização contra Ciretrans de cidades próximas à divisa com Minas para evitar o golpe.

Em julho, o departamento de trânsito baixou portaria reforçando a fiscalização de candidatos a motoristas vindos de outros Estados. O resultado da ofensiva fica claro nos números: em Icém, a média mensal de obtenção e renovação de CNHs caiu de 100 para 35, de acordo com Pedro Curti.

Admitindo

Os motoristas de ônibus Carlos Alberto dos Santos e Róbson Conceição Macedo estão na lista dos 37 indiciados pela polícia de Guaraci por falsidade ideológica. Residentes na cidade, eles obtiveram a CNH por meio da indicação de endereços falsos em Icém.

O primeiro retirou a carteira de habilitação em Icém há quatro anos, quando, segundo informou, morava em Orindiúva, onde não havia Ciretran, e admite ter fornecido endereço falso em Icém. Já Macedo diz que para obter a CNH declarou residir em uma fazenda de Icém onde trabalhava na época.

Os preços também mostram uma diferença interessante. Enquanto que em Guaraci consta que o preço da habilitação era de R$ 950, na cidade de Icém pagava-se apenas o valor de R$ 750.

O delegado Pedro Curi diz que vai auxiliar a Delegacia Seccional na apuração do caso e que vão cassar a CNH dessas pessoas que terão de voltar para a escolinha na cidade de origem e começar da estaca zero.

Até 2004, o responsável pela Ciretran de Icém era o então delegado da cidade, Antônio Honório do Nascimento. No início de 2005, ele se licenciou do cargo para assumir a cadeira de prefeito. Nascimento afirmou desconhecer a investigação do Detran, e negou irregularidades na sua gestão.

Desde 2005 até o mês passado, passaram pela Ciretran vários delegados interinos, segundo Curti. Um deles foi Hélio Fernandes dos Reis, que também negou participação do órgão no suposto esquema.

O dono da auto-escola Fênix, Cássio Lourenço Couto, atribui as suspeitas à briga política da cidade, uma vez que um dos investigados é o atual prefeito. Já o proprietário da auto-escola São Paulo, José Pelarin, nega envolvimento no episódio. Já o proprietário do Despachante Icém não foi localizado pela reportagem do jornal de Rio Preto.