16 de março | 2010

O triste fim da figueira do campo de aviação: virou lenha.

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José Antônio Arantes

Terça-feira, 16 de março de 2010, 17 horas, um chuvisqueiro molha o asfalto negro, como a predizer a morte lenta de um ser que viveu várias décadas, embelezando o local, proporcionando sombra, aconchego para o descanso de muitos.

De tamanho enorme, talvez mais de sete metros de diâmetro, serrada, conserva o tronco em pé. Agonizante, vê uma espécie de sangue amarelo brotar de suas entranhas, morrendo aos poucos, de cabeça erguida, imponente.

Uma vida digna ceifada pela sanha desenvolvimentista de quem não se importou com os milhares de olimpienses que ali descansaram, centenas confessaram seus segredos, outros fizeram juras de amor. Teve até quem em sua casca deixou encravado o próprio coração.

Terça-feira, 17 horas, os pingos de água caem, como a lavar feridas e o som estridente de uma motosserra ecoa pelas redondezas, com seu prenúncio macabro.

Um caminhão lotado de seus pedaços banhados pela seiva que garantiu uma vida quase secular, está prestes a deixar o local, como se levasse parte de um corpo enorme, num ritual fúnebre, rumo à cremação.

Terça-feira, 17 horas, a chuva molha aquele enorme resto de uma espécie de beleza que cruzou o tempo, marcou a história de muita gente e que vai demorar ainda alguns dias para ser extirpada pelo concreto e o asfalto embrutecedores.

Chuva, continue a cair, mais forte, lave com suas lágrimas a alma deste ser que está sendo riscado do mapa de nossas vidas, mas que permanecerá nos nossos sonhos e, sem dúvidas, em muitas histórias de amor.

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