06 de abril | 2014

Elite x Povão

Compartilhe:

Ivo de Souza

O que é uma ou a elite de um país? O termo, historicamente, carrega um viés negativo quando confrontado com a palavra povo. Em uma nação, é possível identificar várias elites, se é que podemos assim dizer: Elite política, elite econômica, elite intelectual e outras mais. Quando as pessoas, em geral, e até os estudiosos, se referem à elite, sempre se referem à elite econômica, detentora do poder por conta de seu dinheiro, muito dinheiro.

Por outro lado, há os “deseliti­zados”. Muitos vivendo miseravelmente; e outros tantos trabalhando em pleno século XXI como escravos (trabalhando para a elite endinheirada, é claro).

Aurélio, em seu dicionário, diz que elite é “O que há de melhor em uma sociedade ou num grupo, nata, flor”. Sociologicamente, define elite como “Minoria pres­tigiada e dominante no grupo, constituída de indivíduos mais aptos e/ou mais poderosos.”

Infelizmente, a elite intelectual não consegue impor-se no país, mesmo porque, no Brasil, a chamada minoria intelectualizada é, pela própria demanda merca­dológica, marginalizada pelos próprios veículos de comunicação. Em termos de mercado não rende lucros; daí prevalecer, atualmente, o chamado lixo cultural. Não informa, não traz conhecimento, não pensa, não reflete. E carrega a massa para onde quer. E faturam esses criadores uma enormidade. Os verdadeiros artistas (os que criam, inventam, rein­ven­tam, recriam…) estão esquecidos pela mídia – de propósito, é claro.

Onde andam Chico, Gil, Caetano, Gal, Jobim, Paulinho da Viola, Mar­tinho da Vila, Jorge Ben, Belchior, Vandré? Onde estão? Onde está a nata da sociedade? A fina flor da inte­lectu­a­lidade brasileira? Do bom gosto, do bom senso, da verdadeira poesia, da grande literatura? Deem uma olhada na lista dos livros mais vendidos no país, por favor. Quem compra livros de Adélia Prado, Graciliano Ramos, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles e outros do mesmo quilate?

Precisamos dar pérolas (sim!) a nossos alunos, preciosidades. Opor­tunidades para que conheçam o bom, o belo, na música, na pintura, nas artes em geral, para que formemos uma elite que venha das classes inferiores (sem acesso à educação de qualidade, sem acesso à cultura), para que possa se conhecer e reconhecer a sua identidade humana, para que desenvolva valores eternos (respeito, solidariedade, amor, tolerância…).

Uma escola não pode ser elitizada (no mau sentido), uma sala de aula não pode ser elitizada. As salas devem ser heterogêneas para que o “ruim” aprenda com o “bom”, para que experiências de aprendizagem e de vida sejam repartidas, dividas, socializadas. Um aprendendo com o outro.

Os mais pobres, os mais humildes, os mais desfavorecidos, em termos sociais, econômicos e culturais precisam receber mais para compensar o nada (ou quase nada) que recebem do meio em que (sobre) vivem.

Só assim deixaremos de falar (teoricamente) em cidadania e passaremos a formar verdadeiros cidadãos na prática da vida diária, no cotidiano de cada um e da comunidade, para que sejam “o que há de melhor em uma sociedade, em um grupo”.

Para que sejam a nata, a fina flor de um mundo necessitado de paz, repleto de todo tipo de violência e de desmandos de políticos (há exceções, felizmente) corruptos. Para que a sociedade não seja estragada, infectada, corrompida, decomposta e putrefata é que necessitamos dessa elite de que acabamos de falar (ou seja, o melhor do melhor de uma sociedade). E nós, professores e pais, precisamos fazer isso por nossas crianças e jovens. Caso contrário o futuro (ou o presente?) da nação continuará seriamente comprometido.

P.S.: Ofereço essas mal – traçadas linhas (in memoriam) principalmente a meus pais (Rita e José), aos meus professores Maria Ubaldina de Barros Furquim e Isaías Miessa, ao sr. Sankiti Takahashi. E a todos os que se dedicam a educar a nossa juventude, essencialmente a mais desvalida, desamparada, desprotegida.

Ivo de Souza é professor universitário, poeta, co­lu­nista, pintor e membro da Real Academia de Letras de Porto Alegre.

 

Compartilhe:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do iFolha; a responsabilidade é do autor da mensagem.

Você deve se logar no site para enviar um comentário. Clique aqui e faça o login!

Ainda não tem nenhum comentário para esse post. Seja o primeiro a comentar!

Mais lidas