05 de maio | 2019

Pra não dizer que não falei das flores: O Vazio que não se preenche. Ou a discussão sobre vida e morte.

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“Morte, única verdade absoluta da vida. Mas quem está preparado para ela? É tudo uma questão de tempo. E este voa. Passa como um foguete. Mas se tudo é fruto da imaginação e não existe nada em nossa mente que não fique igual a uma foto antiga de papel, amarelecida, nossos avós hoje são apenas sombras em nossa mente. Imagens distantes que não participam de nosso presente. Por que então a gente sofre com a partida de quem amamos? Porque ficamos mais sozinhos. À mesa vai faltar alguém sentado em uma cadeira. E seguir encenando esta peça no grande teatro da vida sem nossos coadjuvantes torna o viver mais triste, mais difícil, para muitos impossível de seguir em frente.”

Mestre Baba Zen Aranes.

O QUE ESPERAR …

… depois da partida? Como ficará o mundo sem a sua, a minha presença? Como reagirão nossos filhos, a mulher (ou marido), os parentes, os amigos, aqueles que nos cercaram, amando ou fingindo que amavam? Eis a questão.

FILOSOFICAMENTE, …

… a narrativa inicial teria que levar em conta, primeiro, o chamado momento do rememorar tudo que dizem que passa na cabeça daquele que está deixando o mundo dos vivos. Ou seja, existem aqueles que acreditam que naqueles átimos de segundos, ou minutos, ou horas, que antecedem a vinda da tenebrosa de capa preta empunhando aquela foice bem afiada, a tal da morte, todos os momentos marcantes de nossa vida passam por nossa mente.

CLARO, …

… alguns mais entendidos em tudo diriam que seria a hora em que todos julgam o que foi feito pela grande dualidade, pelo maniqueísmo que baseia todos os julgamentos desde os primórdios da humanidade, mas, principalmente depois de cristo que pregava que tudo teria que estar entre a luz (o bem) e as trevas (o mal).

COMO SABER …

… se você, ao chegar naquele momento fatal, pautou seus atos entre estes dois extremos e onde se situou entre eles? Mesmo porque aí entra a grande dúvida de toda a humanidade para saber o que é o bem e o que é mal.

SE CADA …

… ser humano é único e tem a sua própria verdade e se tudo é fruto da nossa imaginação, nada entrou em minha mente que não tenha sido pelos sentidos, como posso julgar se o meu semelhante agiu certo ou errado. Portanto, qualquer julgamento seria com base naquilo que eu penso, ou seja, na minha própria verdade, que nem sempre vai bater com a sua, ou com a do seu vizinho.

MAS …

… você poderia dizer que existiria uma verdade de maioria que nos é ensinada pelos nossos pais, pela religião, pelos costumes, ou seja, pela nossa moral. Mas como dizer que a nossa moral que prega que lugar de mulher é “choferando” um fogão, que mulher no volante é perigo constante, ou mesmo parafraseando o nosso querido presidente, você aceitaria que um “viadinho” fosse seu motorista e levasse o seu filho na escola todos os dias? Aí não importa se o filho sai com o primo escondido para realizar sua sexualidade. A mulher de Cesar não precisa ser honesta, tem que parecer honesta. Eis as questões.

BOM, …

… a discussão aí se estenderia por parágrafos e parágrafos a fio. E não é esse o tema da viagem na maionese de hoje, destes devaneios de loucura sabático. O que se quer aqui é tentar prever o que acontecerá com este ser carcomido pelo tempo quando chegar a hora de sua partida.

E AÍ, …

… dentro do contexto preambular apresentado acima e, levando-se em conta o fanatismo pela nossa história musical marcante e cheia de teses lindas extraídas da prática de gênios que por aqui passaram, o que vem à mente é a música “Naquela Mesa, cuja letra foi escrita pelo filho de Jacob do Bandolin, Sergio Bittencourt, tentando colocar em palavras o que teria sido o seu pai na sua visão de filho.

SINCERAMENTE, …

… não estando ainda no estertor na morte, mas olhando para trás, na longa caminhada até aqui, realmente gostaria que minha única filha que hoje se arrisca na mesma arte que este velho pai, pelo menos tivesse uma concepção de seu pai, como teve Sergio ao compor a letra para Jacob do Bandolim.

ELEMENTAR, …

… meu caro leitor, em áreas diferentes. Mas arte é arte. Ela tem cunho social. Ela tenta interagir no ambiente. Tenta modificar a vida. Tenta provocar a reflexão de todos, inclusive das massas alienadas e entorpecidas pela ideologia capitalista que escraviza e faz o escravo se acomodar com a ideia de que ele não é mais porque é burro, não tem capacidade de ir além.

ESTE SER …

… “elefarantídeo” passou várias décadas e também praticou a sua arte (a retórica, o discurso, a narrativa) durante toda sua vida e levando sempre em conta o social e não o pessoal. E esta concepção não precisará morrer para ter a confirmação, pois ouve dos mais próximos, principalmente aqueles que cultuam que os fins justificam os meios, que poderia ter obtido muito mais conforto material se não tivesse sido o ser social que tentou ser. Estaria rico e não, após o 60, tendo que trabalhar hoje para comer amanhã.

MAS, …

… mesmo mudando o cenário, com certeza, gostaria que minha tromba e minha trom­binha, a filha querida e a neta que também criei e estou criando como filha, sendo o “Avohai” do Zé Ramalho, quando esta hora chegasse, tivessem a mesma percepção de Sérgio Bittencourt sobre seu pai na história que narrarei a seguir.

CLARO, …

… você poderá achar que seria muita pretensão deste quase ser que vos escreve, mas além de ter o direito de me achar assim, muitas são as coincidências, claro que só materializadas se as minhas atrizes conseguirem vislumbrar como assim sendo.

SEGUNDO …

… o blog Música em Prosa, na internet, esta música foi composta pelo filho no dia da morte do pai, escrita num guardanapo. Apenas isso seria suficiente para que tivesse direito a uma história para ser lembrada por todos. Mais ainda quando o seu compositor, Sérgio Bittencourt, é filho de Jacob do Bandolim, um verdadeiro ícone da música brasileira de todos os tempos.

ESTÁ …

… relatado no site digital do próprio Jacob que, no dia em que estaria completando 60 anos (que completaria em 14 de fevereiro de 1978, se vivo fosse), o jornalista Jésus Rocha, de Última Hora, à época editor do “Segundo Caderno”, pediu ao filho, Sérgio, um depoimento sobre o pai.

AO CORRER …

… da máquina de escrever, Sérgio Bittencourt, jornalista e compositor, escreveu comovente texto acerca da pessoa de Jacob do Bandolim. Trago aqui três pequenos trechos do filho sobre o pai:

— “O que fiz por ele, fiz e não digo. O que fez por e de mim, foi um tudo. Me lembro: jamais me mentiu. Era capaz de esbofetear um mentiroso, apenas pela mentira. Fosse de que gravidade. De tudo que me ensinou, certo ou errado, hoje, dentro dos meus já então parcos e paupérrimos preconceitos, retiro, inapelavelmente, uma solução, uma saída, uma parada para pensar, um pouco de coragem para enfrentar, muita coragem para não “aderir” – na última das hipóteses, um sofisma, uma frase feita – estamos conversados!”

—- “Aos 37 anos de idade, descrente e exausto, sem Deus nem diabo, é que posso afirmar: Jacob Pick Bittencourt foi mais do que um pai. Do que um amigo. Do que um Ídolo. Foi e é, para mim, um homem. Com todas as virtudes, fraquezas, defeitos e rastros de luz que certos homens, que ainda escrevemos com “agá” maiúsculo, souberam ou sabem ser. E homem com H maiúsculo, para mim é Gênio”.

— “Tenho certeza e assumo: não sou nada, porque, de fato, não preciso ser. Me basta ter a certeza inabalável de que nasci do Amor, da Loucura, da Irrealidade e da Lucidez de um Gênio”, conclui.

MAS …

… a maior homenagem do filho para o pai foi a canção “Naquela mesa”. A letra da música que o filho Sérgio fez para homenagear seu pai e, com certeza, muitos de vocês já ouviram, já que foi gravada por vários cantores e insistentemente tocada em todas as rádios. Aliás toca na Rádio Cidade, 98,7 MHz, inclusive com a história sendo contada por meu irmão, o Big Joe, diz o seguinte:

“Naquela mesa ele sentava sempre. E me dizia sempre o que é viver melhor. Naquela mesa ele contava histórias, Que hoje na memória eu guardo e sei de cor. Naquela mesa ele juntava gente, E contava contente o que fez de manhã. E nos seus olhos era tanto brilho, Que mais que seu filho, Eu fiquei seu fã. Eu não sabia que doía tanto, Uma mesa num canto, uma casa e um jardim. Se eu soubesse o quanto dói a vida, Essa dor tão doída, não doía assim. Agora resta uma mesa na sala, E hoje ninguém mais fala do seu bandolim. Naquele mesa tá faltando ele, E a saudade dele ta doendo em mim”.

POSSO …

… não ser tudo isso. Mas com certeza, gostaria que de outras formas, ou de outros jeitos, tivesse reconhecido pelo menos por estas duas figurinhas de quem muitas vezes tive que me afastar e deixar de paparicar para levar adiante a minha revolução, que foi tudo com muito amor e, que não teria conseguido amá-las como as amei, se não tivesse tido a oportunidade de amar todos vocês como os amei e continuarei amando até morrer.

E O PIOR OU MELHOR …

… de tudo, é que acabo de chorar ao tentar declamar esta letra para minha netinha/filha, após tomar alguns copos daquele líquido espumante, sentado à mesa que não está na sala, mas na cozinha e que sempre foi palco de muitas histórias, de muitos debates, de muitas discussões, principalmente sobre a vida, sobre o que é viver melhor.

José Salamargo … lucubrando sobre a vida, não sobre a morte, pois esta ainda não veio e este escriba não conheceu ninguém que voltou para contar, mas exercitando esta coisa humana que é transformar instintos em emoções, para exercitar sentimentos que são denotados pelo aflorar das lágrimas, do disparar de corações, do ofegar respirações e mostrando que embora tenha quem entenda que não exista, esta pode ser sentida, exercitada e principalmente vivida.

 

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