19 de junho | 2012

Ex-morador de Altair conta parte da história de Rio Preto

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Vaelson Taveira Ferraz, de 63 anos de idade, que nasceu em 1º de maio de 1949, em Altair, relata parte da história de São José do Rio Preto, para onde se mudou com a família quando tinha ainda cinco anos de idade. Ele começou a colecionar documentos históricos da cidade e objetos em 1970.

Ferraz que é casado e pai de três filhos, possui o 1º álbum de figurinhas do Brasil – A Holandesa (lançado em 1934), em perfeito estado. Completou todas as figurinhas “garimpando” na internet.

No relato que fez ao jornal Diário da Região, daquela cidade, ele falou em carro de boi, jardineira, ponto de charretes, charmosas praças, rixa entre negros e brancos, jogo do Pelé, antiga escadaria da ferroviária, cine São José e cine Rio Preto, Rádio PRB-8 e o carro Chevrolet Buick desfilando pelas ruas. Fragmentos da história de Rio Preto.

Quando eu e minha família viemos de Altair para a cidade, em 1953, tudo era bem diferente. Sem asfalto, água de poço, fogão a lenha e lamparina. Em 1956, já com sete anos de idade, começava conhecer a cidade e a trabalhar como engraxate com dois irmãos mais velhos, Wandelson e Waelte, numa das duas árvores circundadas de bancos em frente a nossa saudosa Catedral São José. Com a graxa e um velho pano.

– Ei, garoto, quanto que está para engraxar o meu sapato?
– Apenas dois cruzeiros, amigo.

Assim era do nascer ao por do sol, e todo dinheiro ganho era entregue à minha saudosa mamãe Sebastiana, que nos finais de semana dava-nos alguns trocados para eu e meus irmãos irmos ao Cine Boa Vista ou Esplanada, famoso pungueirão. Todo domingo, corríamos para os cinemas assistir ao programa Zig Zag, voltado para crianças de sete a dez anos.

Nessa caminhada de trabalho e diversão as histórias aconteciam. Com 40 metros de comprimento, a antiga escada da ferroviária era marcante. Charretes ficavam encostadas esperando passageiros. As barraquinhas de frutas e os homens reunidos batendo papo também marcaram minha infância. Até que um dia, espanto! Um homem é morto na escada.

Mais tarde, escuto os senhores falando que o homem morto tinha abusado da irmã de um tal Aníbal Vieira, o justiceiro de uma vila próximo da minha antiga cidade: Altair.Eu criança, sem saber o que fazer, não podia desviar o caminho. Outro espanto! Um homem é jogado da escadaria. Dormia em um pequeno carro beirando a escada, quando foi jogado por alguma pessoa má. Que triste fim!

Em 1958, com nove anos, comecei ouvir:
– O rei do futebol vai jogar em Rio Preto contra o América.

Nossa, o rei do futebol? Me questionava. Ingressos colocados à venda, três dias foram suficientes para esgotar. Correria total para garantir o melhor lugar no Estádio Mário Alves Mendonça. Como vou fazer? Sou pequeno demais e ninguém vai abrir caminho para um moleque. Pronto, já sei. Uma mão segura forte, o pé vai raspando, mas consegui me equilibrar e ficar firme em um pé de eucalipto atrás do gol. O jogo foi fantástico, o zagueiro Julinho marcou o Pelé muito bem e a partida acabou empatada em 0 a 0. Foram meses de comentários sobre o jogo.

Na praça da Matriz continuava a jornada, porém outro fato triste para minha infância. Aos finais de semana, havia bandas se apresentado no coreto que tinha na praça, mas foi derrubado e acabou com a alegria das pessoas, nos anos 60.

– Corram, Wandelson e Waelte, eles estão chegando.
– Quem está chegando Vaelson?, perguntavam meus irmãos, assustados.
– O carro de boi.

Assim era, praticamente, todos os dias na rua Expedicionários com a rua Fritz Jacob, onde morávamos. Ali, na esquina, eu ficava esperando os carros passar carregados de algodão que iam para algodoeira do Gabriel Jorge Cury, conhecido como Japurá. Ainda criança, lembro da inauguração da rádio PRB-8, com um auditório onde o público podia ver seus ídolos.

Para não enfrentar fila, tínhamos que ir cedinho. Corre… corre, Inezita Barroso vai se apresentar, escutei. Fui até o local e vi a grande estrela de pertinho. Isso também aconteceu com Vicente Celestino. Ouvi uma de suas músicas mais famosas: “O Ébrio”: (…) “Tornei-me ébrio, na bebida busco esquecer, aquela ingrata que me amava e que me abandonou. Apedrejado pelas ruas, vivo a sofrer, não tenho lar, e nem parentes, tudo terminou”.

Essa música era marcante na cabeça de todos naquela época. Na Rádio PRB, também não perdia um programa “Clube da Cirandinha”, que era apresentado por César Muanis e Adib Muanis. Toda de madeira, a jardineira encostava para levar os passageiros até Ribeirão Claro, hoje Guapiaçu. Com o preço de 5 cruzeiros, elas iam lotadas. Escutávamos barulhos. Pronto, era a certeza de que as malas tinham caído e o motorista ia parar para pegarmos as bagagens. Isso era constante na viagem.

A juventude foi chegando logo. Nos anos 60, veio o emprego no Banco Comind, e lá comecei a ver que existiam a praça de baixo e a praça de cima, frequentadas por negros e brancos, respectivamente. Eles não se misturavam, tinham rixas. Barulhos de máquinas, barraquinhas com vários produtos, pessoas transitando e os jovens fazendo footing – as moças circulavam num sentindo e os moços em outro – marcavam a praça Rui Barbosa e a rua Bernardino de Campos. Na praça também existia o Cine Rio Preto, que hoje, é o Praça Shopping.

A chuva também era perigosa. Em 1971, aconteceu na frente do clube Palestra, a segunda maior enchente de Rio Preto, pois a primeira aconteceu em 1956, e chegou a três metros de altura. Em 1991, já trabalhando como agente penitenciário no Instituto Penal Agrícola (IPA), consegui salvar 45 mil documentos de títulos eleitores (2ª via) que iam ser inutilizados.

Desses, achei os de Alberto Andaló, Ana Maria Braga, Anísio Haddad, Amaury Jr., Mário Alves Mendonça, entre outros. Assim, guardo todos os documentos, fotos e outros objetos antigos com muito orgulho. Pois acredito que uma cidade que não preserva o seu patrimônio e sua história, jamais verá o reflexo da sua própria imagem.

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