22 de novembro | 2020

Uma filha de casal olimpiense conta como é viver na Suécia

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COMO É LÁ FORA!
Naiara Cunha entende que embora o país
tenha segurança as pessoas
sofrem de solidão e depressão.

Naiara Cunha, filha do prefeito Fernando Cunha e da advogada olimpiense Sheila Ribeiro Pereira, que é vereadora pelo Partido Verde em Södertälje, na Suécia e veio acompanhar os últimos dias da campanha à reeleição do pai, contou para os ouvintes do Programa Cidade em Destaque pela rádio Cidade, na segunda-feira, 16, como é viver na Suécia nos dias atuais, um país de primeiro mundo, regido pela chamada socialdemocracia.

Naiara, em dezembro de 2018, quando esteve na cidade, também foi entrevistada no programa. Desta vez, veio acompanhada da irmã, Laila que milita na área do turismo e, durante o programa recebeu a visita da outra irmã, Talitha que é atriz e, antes da pandemia, apresentou a peça “O Jardim da Meia-Noite” em Olímpia no final do ano passado. Talitha participa do programa na TV Cultura, chamado “Tá certo?”.

Naiara, que ficou três semanas em Olímpia, inicialmente falou sobre o que viu e o que achou do que presenciou na campanha do pai.

— Acho está tendo uma mudança política enorme no Brasil e nos Estados Unidos, que o Trump não se reelegeu com essa tática. Eu pessoalmente acho que o Fake News é um problema para democracia, e não é só nos Estados Unidos, não é só no Brasil, é no mundo todo.

GASTA-SE MUITA

ENERGIA PARA

CONTORNAR

O ÓDIO

— Eu acho que se gasta muita energia tentando contornar o ódio ao invés de você trabalhar para a política. As pessoas tentando achar Fake News o tempo todo e gente tentando mostrar que não é verdade o tempo todo. É muita energia que poderia ter sido gasta por algo mais útil, para o povo. É diferente de você não concordar com uma proposta, isso não foi nem discutido, você discute um fake news.

E na Suécia, é assim também?

— Não! É bem diferente. Acho que o nível de escolaridade é maior, então as discussões são em outro nível. Uma diferença gigantesca que presenciei porque fui todos os dias com meu pai nas caminhadas, a gente conversava com o povo e eu adoro ouvir o que as pessoas estão dizendo para entender a realidade e você vê que tem uma preocupação ainda com o eu. A pessoa olha assim e fala o que ela precisa para ela, mas tem pouca preocupação com o público, não consegue ver o todo. Lá na Suécia, por ser um país muito mais velho, que tem um pensamento no grupo, as pessoas raramente vêm pedir alguma coisa no bairro dela, coisas específicas, elas geralmente pedem para a cidade. Isso foi um choque, mas eu entendo a condição, eu entendo o porquê, tem muita coisa ainda a ser feita, trabalhada.

Qual a diferença entre uma campanha para vereador aqui e uma campanha para vereador na Suécia?

— Lá o partido escolhe uma lista que eles falam quais são os melhores candidatos. É o partido que escolhe e coloca em ordem de preferência do partido. Essa avaliação é muito rigorosa, são entrevistas com mais de uma pessoa, eles tiram as referências, é um processo longo. Quando você vai fazer campanha, você não faz campanha em nome próprio, porque já tem uma lista pré-estabelecida do ranking.

— No meu caso, eu não fiz campanha para mim. Eles me colocaram na internet por conta do meu perfil mais jovem, porque eles acharam que isso seria bom, mas não teve um panfleto, nada escrito com o meu nome. Quando eu estava na rua, eu falava a favor do candidato número um e número dois, que eram os líderes do partido na época. Eu era a número três.

Sobre a carreira na Suécia.

— Eu tenho uma carreira política esquisita dentro do Partido Verde. As pessoas entram pelo ambiental, eu entrei pelo social. Eu acho que o pensamento social do partido é muito bom.

Como foi o período de pandemia na Suécia?

— Uma superpolêmica, porque eles optaram por não seguir as recomendações que os outros países da Europa estavam seguindo. A gente não fez o lockdown, a gente não usa máscara, tem restrições, mas são menores do que nos outros países, por exemplo, no máximo 50 pessoas podiam se reunir no mesmo local, hoje, agora acabaram de reduzir isso para oito pessoas no máximo por causa do começo na segunda onda.

— A Suécia é um país de baixa densidade populacional, então tem pouca gente morando na Suécia. É o país com o maior número de pessoas que moram sozinhas. Isso quer dizer que quando você fala para fazer o isolamento, na Suécia as pessoas já viviam em isolamento e o sueco é extremamente disciplinado. Então, quando o governo fala ‘trabalhe de casa se for possível’, para eles é o mesmo que falar ‘você está trabalhando de casa a partir de hoje’. Eles cumprem, é um negócio fantástico porque eles entendem quais são as consequências.

— O país pode adotar uma política totalmente diferente que a gente só vai saber se deu certo ou não na hora que tudo acabar. A segunda onda está vindo, está quase na Europa inteira, em alguns lugares mais grave que a anterior, mas  na Suécia a segunda onda ainda não chegou no nível que chegou em outros países.

Como o Estado ajudou as pessoas no país em que você vive?

— A Suécia é um país muito rico e que tem muita indústria de tecnologia. É lógico que a crise pegou todo mundo, mas o país não fechou completamente em nenhum momento, então até o barzinho da esquina, o restaurante conseguia gerar alguma coisa para conseguir se manter. Muita gente mesmo assim entrou em falência. Na área da cultural, não teve o que fazer e teve que encerrar, teve que fechar na área de esportes também, então o governo começou a dar dinheiro para as áreas ou para a organização, ou fazia programa para as pessoas que estavam desempregadas e não deixava as empresas demitir, o governo pagava o salário para os trabalhadores.

Qual principal ponto negativo do país?

— Eu acho que o maior problema lá é depressão e a solidão. Tem uma depressão enorme, tem gente, principalmente idosos, que os filhos abandonam porque é dever do governo cuidar dos idosos. Tem gente que mora em algum apartamento e demora seis meses para ser encontrado morto, porque ninguém visita. O problema lá é a solidão, alto índice de suicídio. É um país que funciona muito bem, que a economia roda, você se sente muito seguro, só que você se sente muito sozinho. As pessoas são calorosas como aqui no Brasil.

O que levaria a esta situação?

— Deve ser uma questão cultural. Lá eles têm muito respeito ao outro, o respeito do seu espaço, então se você está triste, é problema seu e eu não quero entrar no seu espaço, perguntar o que você tem. E se perguntam acham que estão invadindo o espaço do outro, então, assim, não tem fofoca também.

O que o vereador faz lá? O vereador recebe salário?

— O vereador não recebe salário. Como tudo é feito em partido, dentro do partido, então ele determina junto com o partido o que vai ser feito. Essas questões parecidas que têm aqui, a gente tem que tomar a decisão, só que as secretarias são compostas pelos políticos, por exemplo, a Secretaria da Educação toma a maioria das decisões. Vem para gente se tiver que fazer uma mudança muito radical no currículo, vem para gente se você tiver que fazer uma mudança orçamentária, mas os vereadores, a gente se reúne uma vez por mês.

Sobre como são feitas as leis.

— Tem uma constituição e todas essas legislações, que na verdade elas não são leis, são como diretivas, mas isso é trabalhado pelas secretarias. Vai ter um negócio que seja da Secretaria do Meio Ambiente, já foi discutido por todos os partidos em dois níveis, pelo menos, até chegar no vereador. Quando chega para mim, já foi discutido, então ela é basicamente aprovada, porque tudo que teve que ser alterado já foi alterado, ela já vem aprovada em outros níveis.

Lá existe salário mínimo ou coisa parecida?

— Não tem. É muito esquisito. Eu não entendia como é que um país como esse não tinha salário mínimo. Mas lá os sindicatos são muito fortes, então apesar de não ter salário mínimo, tem um salário mínimo determinado pelo sindicato. Ninguém ganha menos do que R$ 6 mil na Suécia, mas o custo de vida é altíssimo.

 Como é o atendimento médico, a saúde, como é?

— Vocês vão ficar chocados, mas a saúde de Olímpia e de muitos municípios é muito melhor do que o atendimento que a gente pode ter lá. Para dar um exemplo para vocês, tive um amigo que cortou a mão com uma bobagem em casa, com uma faca, mas cortou, aí ele foi para o hospital mostrou a mão, ia ter que costurar. Então, eles arrumaram, enfaixa­ram, não tinha como operar no dia e ele ficou esperando em casa para operar no dia seguinte. Apesar de ser um país com muito dinheiro e tal, não dá para ter um tipo de atendimento que as pessoas esperam. Ninguém fica sozinho em um quarto de hospital, todo mundo divide tudo, você espera para fazer exame. Já cheguei a esperar seis meses para falar com um médico.

O sistema é só público ou tem privado?

— Tem uma parcela mínima do privado. Pouquíssima gente usa. Eu diria que é o pessoal esnobe que usa, porque até o rei e a rainha usam o sistema público.

Sobre a educação.

— O sistema é público e se você está estudando, ganha para estudar. É um valor básico, só que você tem um empréstimo a preço de banana que o governo te dá para você conseguir se manter enquanto estuda, porque eles querem que quando a pessoa estuda, só estude. Depois ele paga esse empréstimo para o governo só quando estiver empregado e vai pagando aos pouquinhos.

—  Apesar de ser público e disponível para todos, tem uma questão comporta­mental. Quando você nunca viu ninguém na sua família estudar, quando não tem ninguém que chegou lá e você é jovem e alguém tiver te oferecido emprego, você larga o estudo mais cedo. Então tem muitos grupos que não conseguem fazer como a gente chama, a viagem de classe social.

Sobre três verea­do­ras eleitas em Olímpia.

— Eu acho que é uma surpresa boa ver que tem um movimento e se a gente for ver um pouco com o que aconteceu em São Paulo, eu acho que o pessoal fez uma campanha surpreendente, muitas mulheres sendo eleitas e o grupo LGBT sendo incluído. Eu acho que a gente começa primeiro por representatividade, porque não tem outra forma. É que nem a Kamala Harris, vice-presidente dos Estados Unidos, quando você vê que é possível ter uma mulher negra vice-presidente, isso me faz muito feliz como mulher, porque a gente ainda como mulher é muito machista.

— Eu sou uma pessoa que tenho uma boa formação, gosto e me preparei para o cargo que estou assumindo, só que quando fui assumir, como mulher, pensei que ia sofrer muito preconceito, mas não sofri porque a cultura lá é diferente. Eles me respeitaram muito desde o início, mas estou habituada a vir do Brasil e saber que quando eu trabalhava em escritório de advocacia, fui paquerada por vários advogados e de forma de te constranger.

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