23 de novembro | 2014

O Dia da Consciência Negra e a manifestação branca do comércio

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Do Conselho Editorial

Engraçado, embora muito ridícula a forma como o sistema capitalista observa certas questões sempre pelo ângulo do lucro, como se o humano não existisse.

Para alguns comerciantes e industriais parece que este tempo não precisa de afetos, precisa pura e simplesmente do ter e não do ser.

Há uma manifestação, que não é privilégio da cidade de Olímpia, mais de várias onde se decretou feriado o Dia da Consciência Negra, para tornar facultativo este dia, o que viabilizaria a abertura do comércio e consequentemente mais vendas, mais lucros.

Nada demais e nem de menos, já que o dia da consciência negra no Brasil foi instituído exatamente por conta de um peso na consciência da nação que explorou ao limite da barbárie a raça negra e depois a abandonou a sua própria sorte quando da abolição da escravatura.

Se há dia da consciência negra, deveria ter o da consciência branca ou amarela, e só não há porque estas  raças não foram consideradas inferiores, não foram escravizadas, humilhadas, conduzidas ao limite máximo de desprezo que uma sociedade hipócrita e desprovida de humanismo pode conduzir seu semelhante.

Outras nações, outros povos, dedicaram aos negros tratamentos desumanos e degradantes da mesma forma que a nação de Zumbi dos Palmares e Ganga Zumba.

O país da casa grande e senzala, no entanto, busca se redimir deste passado vergonhoso com políticas públicas de inserção dos negros, como cotas, projetos sociais em quilombos, datas festivas, etc.

Todas estas tentativas e tratativas são contestadas pela elite branca dos olhos azuis, que ainda, de forma neonazista, se posiciona contra todas as manifestações que evidenciem uma posição mais favorável a presença do negro na sociedade.

Com o comércio não poderia ser diferente; há uma insurreição em relação ao feriado, por que diferente da Páscoa ou do Natal, os comerciantes ainda não conseguiram encontrar uma forma de lucrar com o feriado, e como o deus do mercado é o dinheiro esticam a corda para enforcar o feriado.

Para dar um exemplo clássico do comportamento hipócrita do mercado, quando se levou a efeito a primeira parada gay em São Paulo, no governo de Marta Suplicy, a revolta do mercado foi geral, achavam uma aberração, hoje, após descobrirem um filé extremamente lucrativo no segmento, prestigiam, apoiam, desejam o evento, que lota hotéis e promove vendas substanciais no comércio no período.

Já o dia da Consciência Negra, como se trata de comemorações muito mais políticas que envolvem seminários, debates, cursos, e não adicionam lucros nas caixas registradoras e nas contas dos empresários, a ideia é acabar com ele.

A segunda parte da intenção de transformar o dia em facultativo chega a ser risível, por que evidencia a questão da tentativa de continuidade da escravidão, não se chega a um denominador comum por que o comércio quer, deseja ter as portas abertas neste dia, mais se nega a pagar horas extras aos funcionários.

Parece que a escravidão não acabou, ou que a ficha não caiu para alguns, falta desenho com mais nitidez da realidade.

Alegam a seu favor que abrindo poderiam não ter lucro suficiente para pagar hora extra, e não explicam a razão de abrir em dia não lucrativo.

Mais ainda, deixam o entendimento de que não podem arcar com prejuízo, parecem se esquecer que o funcionário não é sócio de suas empresas, e que também não podem arcar com o prejuízo de trabalhar sem receber.

Na lógica marxista predominante no capitalismo, o capital empregado pelo empresariado para gerar renda e emprego é seu capital disponibilizado para montar seu comércio ou indústria, na outra ponta, o capital do assalariado é exatamente a força de trabalho, que lhe produz renda para sua manutenção.

Assim como o empresário não pode disponibilizar as mercadorias, produto de sua renda, de forma gratuita, não pode o trabalhador disponibilizar de seu capital constituído na forma de trabalho de forma gratuita também.

O legislador entendeu como legítima a comemoração e implantou o dia, o comércio, que visa lucro, fora as exceções, se insurge contra, nada mais coerente que entrasse em um entendimento de mercado não escravista, não explorador, não capitalista selvagem, com visão do período feudal e lutasse a favor de que o feriado fosse facultativo pagando as horas extras aos funcionários.

O que não se pode conceber é a manutenção do discurso de mão única onde apenas o explorador, o colonizador ganha e o colonizado se mantém escravo por conta do discurso da geração do emprego como se fora um favor prestado pelas oligarquias, e não um canal de reprodução de ampliação do capital de ambos como deveria ser visto e é na atual relação moderna de consumo e trabalho.

Do contrário, que se instale os troncos nos paços, que se revogue a Lei Áurea, por que o discurso dos bárbaros está ai presente, vivo, desconhecendo o direito dos libertos.

 

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