28 de fevereiro | 2021

Olímpia 118 anos: como comemorar quase um morto por ano?

Compartilhe:

“118 anos e 108 casos fatais, não há história
ou poesia que resista. Mais de uma centena
de cidadãos que construíram suas famílias,
que deram parte de sua vida contribuindo
para o sucesso e o progresso da
comunidade baixaram sepultura
sem poder se despedir dos seus”.

 

Do Conselho Editorial

Olímpia, no dia 02 de março, deveria comemorar seus 118 (cento e dezoito anos) anos de existência e, no dicionário e no imaginário, comemoração significa realizar cerimônia de evocação de um fato, um acontecimento, uma pessoa, etc.; ou trazer à lembrança; recordar, memorar; mas não parece que seja o momento de comemorar o que quer que seja.

Embora nossas autoridades Executivas e Legislativas estejam viajando em outros planetas, demonstrando não ter noção alguma da realidade, a situação caminha rapidamente em direção à catástrofe sanitária e econômica.

A título de justiça, o governo municipal em nada difere das instancias estaduais e federais no que tange a falta de ações efetivas no combate a epidemia.

As informações desencontradas, o abre e fecha, a falta de leitos, a suspeição de fura filas, secretário de saúde inexistente, tudo é tragédia e comédia, com maior ou menor mediocridade.

E a cidade que já foi de Menina Moça a Capital do Folclore e se transformou em pujante Estância Turística, por inabilidade, incompetência, demagogia, populismo, falta de autoridade, vai retomando o fracasso das crises do café e da laranja.

Os métodos empregados, embora vendam a uma parcela a sugestão de preocupação com a saúde pública, por outro lado se dobra ao capital e o que se faz de enérgico em um dia se perde no outro por ceder à pressão do capital e, ao final, quem sai perdendo é o próprio capital.

O discurso da incoerência é predominante; de um lado os que defendem a abertura do comércio e o fechamento dos clubes termais; do outro que se feche o comércio e mantenha os clubes abertos.

Não conseguem entender que falam e praticam o mesmo discurso de salvação da economia com viés de convencimento mais e menos rebuscado, só isto e nada mais.

Ao ouvir os dois discursos, sem nenhuma base fática ou científica, a sensação que passa é que o mundo é composto de dois tipos de seres humanos distintos e que são, por razões financeiras, transmissores e não transmissores do SARS-CoV-2, o que, na verdade, só faz aumentar as dificuldades no combate a pandemia.

Há um cabo de guerra relacionado aos interesses econômicos de cada um destes grupos convergentes na divergência que inevitavelmente fará com que o caos se amplie e a própria economia sucumba em razão do descontrole da epidemia.

Coerência seria discutir as melhores práticas que resultaram em recuo do número de casos e colocar em prática não só aqui, mas em todos os lugares.

Olímpia registra mais de 55.000 mil habitantes e os números indicavam na sexta-feira 108 mortos por Covid.

Araraquara com 238 mil habitantes em 21 de fevereiro registrava 171 mortes.

Se Araraquara tem mais de quatro vezes o número de habitantes de Olímpia, dever-se-ia concluir que o óbvio seria ter mais de quatro vezes o número de infectados em termos percentuais de Olímpia.

Não é esta a lógica que os governantes locais adotariam e enquanto lá se fecha tudo, por aqui se faz uso do jeitinho brasileiro para ir se levando com a barriga, mesmo que se amplie o número de casos.

118 anos e 108 casos fatais, não há história ou poesia que resista.

Mais de uma centena de cidadãos que construíram suas famílias, que deram parte de sua vida contribuindo para o sucesso e o progresso da comunidade baixaram sepultura sem poder se despedir dos seus.

108 almas que transitaram pelas ruas, riram, choraram, contaram piadas, se embriagaram com as paixões que a vida produz, se encantaram e se desencantaram e cantaram amores, esperanças, louvaram deuses, amaram flores e jazem silenciosos levados pela crueldade de uma doença fatal.

Muitos mais não olharão os raios de sol nem se banharão de luares deste sertão.

Muitos não mais irão caminhar por estradas poeirentas, se banhar em riachos, andar a cavalo, apartar bois, contar dinheiro, admitir e demitir empregados.

Muitos não mais empinarão pipas, nem irão participar ou assistir as peladas de futebol de fim de tarde, tomar sol na laje, churrasquear no final de semana, embalar filhos e netos.

Muitos não mais pegarão lambaris nos riachos, beijarão a namorada, festejarão aniversários, lamberão sorvetes de milho verde, ouvirão histórias que o vento traz, bailarão ao som do silêncio, ou tomarão uma talagada perdido em pensamentos.

Muitos já não estão aqui e muitos não estarão.

Como uma árvore é dependente de suas raízes, galhos, folhas e frutos, uma cidade é a conjunção e a composição de todos que nela vivem, seus filhos amados e queridos.

Qualquer, ou todas cidades são uma grande família dispersa onde todos os membros sofrem e sonham juntos e neste momento em que se perdeu 108 membros desta família, comemorar 118 anos, só se for invertendo a ordem e o valor das coisas.

Não há celebração onde imperam tristezas, lágrimas e dor.

Compartilhe:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do iFolha; a responsabilidade é do autor da mensagem.

Você deve se logar no site para enviar um comentário. Clique aqui e faça o login!

Ainda não tem nenhum comentário para esse post. Seja o primeiro a comentar!

Mais lidas